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Eucalipto e incêndios florestais

Na sequência da notícia veiculada pela agência Lusa de que duas associações ligadas à produção do eucalipto e do papel defendem a expansão desta espécie como forma de evitar riscos de incêndio, não pode a Milvoz – Associação de Protecção e Conservação da Natureza deixar de expressar o seu mais veemente desacordo relativamente a essa posição. O eucalipto é uma espécie exótica de crescimento rápido, pirófita e propagadora de chamas, cujas plantações têm impactos extremamente negativos em termos de biodiversidade, de preservação da identidade paisagística e cultural e na conservação de recursos essenciais como a água e o solo. Problemas estes que, de todo, não se colocam em relação a formações florestais maduras de espécies nativas, com frequência erradamente vistas como sofrendo de falta de rentabilidade.



Aumentar a área de produção do eucalipto, que é já enorme e muito superior ao que as estatísticas oficiais levam a crer, seria um agravamento da actual situação dramática que o país vive no que diz respeito aos incêndios florestais. É certo que o abandono das terras, em caso de baixa rentabilidade, é também um factor que propicia os fogos rurais e é com base neste princípio que aquelas associações justificam a sua posição. Porém, a solução para este problema nunca será a substituição da vegetação nativa por mais povoamentos de eucalipto, um tipo de perspectiva muito restrita que muito tem, ao longo das últimas décadas, contribuído para a situação calamitosa em que nos encontramos actualmente. Hoje, esta espécie domina extensas paisagens monótonas onde outrora existiam carvalhos, sobreiros ou castanheiros, ocupando já mais de 850 mil hectares em território nacional, sobretudo no Litoral Centro e Norte. As medidas estruturais que deveriam ser efectivamente tomadas são completamente ignoradas e levam-nos a desperdiçar excelentes oportunidades para restaurar ecossistemas degradados e reequilibrar a nossa floresta. Assim, a Milvoz aproveita esta oportunidade para expressar o seu ponto de vista sobre quais as acções concretas que considera críticas para a alteração do actual paradigma dos incêndios em Portugal:

1. A plantação de eucaliptos deverá estar sujeita a regras equivalentes a um licenciamento industrial, ou seja, limitada a determinadas áreas específicas, dependente do cumprimento de requisitos de segurança em termos de manutenção, vigilância e capacidade de intervenção imediata em caso de incêndio, bem como a obrigatoriedade de implementação de descontinuidades – fora deste âmbito, deverá ser estritamente proibida com sanções agravadas.

2. Para o restante território, deverão ser publicadas oficialmente listas de espécies autorizadas, preferencialmente nativas, em função das respectivas condições edafo-climáticas.

3. Alteração da lógica de aquisição e contratação de meios de combate e prevenção de incêndios, de modo a quebrar a actual circularidade da designada economia do fogo, mais concretamente, a criação de avenças com empresas privadas cuja remuneração não dependa do esforço despendido, mas sim da redução da área ardida, definição da incompatibilidade entre as funções de combate/prevenção de incêndios e a venda de materiais e equipamentos para esse fim.

4. Alteração da moldura penal do crime de fogo posto, não exclusivamente pelo agravamento das sanções, mas principalmente através da inibição efectiva da circulação, durante a época crítica, de pessoas acusadas deste crime.

5. Aceleração e obrigatoriedade do processo de registo de propriedades rurais no BUPI (Balcão Único do Prédio) que, em conjunto com um regime especial para resolução de heranças indivisas de propriedades florestais, permitam uma gestão integrada do território a curto e médio prazo.

6. Reforço significativo da participação das forças armadas na prevenção e combate a incêndios.

7. Aceleração dos programas de remuneração dos serviços dos ecossistemas, ainda muito incipientes, e fortalecimento dos mecanismos participativos integrados de gestão da paisagem (AIGP).

8. Revisão da legislação relativa à gestão das faixas de combustível, profundamente desadequada, ineficaz, e em muitos casos, contraproducente, que para além de custos extremamente elevados, tem conduzido à destruição de enormes áreas do território anteriormente em bom estado de conservação natural e eliminado o seu potencial enquanto sumidouros de carbono.

9. Aumento significativo da importância do controlo de invasoras – especialmente acácias, pela expressão que já adquirem no território e enquanto povoamentos potenciadores da propagação do fogo – nomeadamente em termos de apoio à investigação científica sobre esta matéria.

10. Reforço da fiscalização e vigilância do espaço florestal, por forma a garantir a correta implementação das normativas de uso da floresta e ordenamento do território em vigor.

A Milvoz está naturalmente disponível para detalhar a sua perspectiva sobre cada uma destas medidas propostas junto das entidades que o desejem. Apelamos também à mobilização da sociedade civil para que, cada um e na medida das suas possibilidades, possa contribuir para a concretização desta agenda que, estamos certos, tem a capacidade de, não só, verdadeiramente reduzir de forma acentuada a tragédia dos designados piroverões, como devolver aos portugueses uma paisagem mais biodiversa, aprazível, saudável e assente nas suas raízes naturais.

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